sexta-feira, 30 de dezembro de 2022

Parque Estadual do Espinilho, ímpar

 Ave!!!

Quem é birder e se interessa pelas aves brasileiras, se já não conhece, algum dia certamente vai ouvir falar do Parque Estadual do Espinilho. 

"Espinilho" é o nome popular de um conjunto botânico típico desse ecossistema, caracterizado pela grande quantidade de estruturas espinhosas e pelo pequeno porte.

Essa vegetação tão peculiar, que quebra a homogeneidade paisagística dos Pampas, possui uma avifauna típica, com forte presença da família Furnaridae, cujo mais famoso representante é o joão-de-barro. 

A má notícia é que esse ecossistema foi praticamente todo dizimado em território nacional, resistindo somente nessa unidade de conservação, o que torna esse Parque importantíssimo para o Brasil. 

A boa notícia é que podemos contar com servidores e colaboradores que dedicam suas vidas a protegê-lo (pois a depender do poder público competente... a incompetência e o desleixo são notórios).

Foto: Bruno Dinucci

Foto: Bruno Dinucci


Faço agora um importante parênteses pois tenho que agradecer ao amigo e grande naturalista Ricardo Oliveira por todo apoio. 

Além de sua extrema disposição em nos ajudar em todo planejamento dessa expedição que também se estendeu à Argentina (foram meses trocando mensagens), o Ricardo é um dos maiores birders do Brasil! 

Suas incursões aos infindáveis campos sulinos já renderam várias novas espécies catalogadas para o Brasil. Com certeza a ornitologia brasileira deve muito a esse grande observador!

Foi inclusive o Ricardo que fez a ponte com a equipe ímpar do Parque Estadual do Espinilho. 

Olha, em treze anos rodando várias unidades de conservação pelo país afora, nunca vi uma equipe tão dedicada e comprometida! 

E não digo somente da dedicação ao Parque (heroica por sinal), mas a nós próprios, observadores de aves.


Nosso primeiro dia de incursão ao Parque foi uma aula magna sobre o "Espinilho". 

O grande Maurício Scherer, seu gestor, ia contando a história natural do local, com breves mas atenciosas paradas para registrar sons e anotar encontros com mínimos seres vivos, demonstrando conhecimento e veneração pela natureza daquele lugar. 

Mais tarde me contou que quando passou no concurso escolheu o Parque do Espinilho pela admiração e desejo em trabalhar em prol de sua preservação. 

O xará do nosso parceiro nessa aventura, o Bruno, assim como o Maurício, dedica sua vida àquela joia encrustada nos rincões do nosso país e juntamente com a monitora Bianca, formam uma equipe top das galáxias. 

Entre trabalhos administrativos, burocráticos e tudo mais que precisar, eles ainda acompanham os visitantes (na maioria birders) por todo parque (são kms de caminhadas sempre sob extremos, lá é oito ou oitenta, ou muito quente ou muito frio). 

O cuidado deles é tamanho que não é permitida a entrada de visitantes desacompanhados.

Também pudera, muito provavelmente aquela área de menos de dois mil hectares seja o último refúgio de uma espécie icônica no nosso país e que falaremos na segunda parte desse relato.

Vou terminando essa introdução com meus sinceros agradecimentos a esses abnegados servidores, não só por nos acompanharem vários quilômetros sob escaldantes 40 graus para nos apresentarem às aves do "Espinilho", mas principalmente pela dedicação à causa, lutando contra vários e graves problemas, que vão de crimes ambientais à total falta de investimentos. 



Ninho de ema aos pés do inhanduvai (Prosopis affinis)

Apesar do grande porte e da vegetação aberta, é mais fácil ouvi-las do que vê-las no "Espinilho"

Introduzindo as aves do Parque e para não nos estendermos muito mais, vou só falar de uma espécie que por sua importância virou até nome de uma das plantas típicas do "Espinilho", a ema. 

Inhandu é um dos nomes populares da maior ave brasileira, e a semente do inhanduvai só germina se passar pelo trato digestivo do inhandu. Já viu de onde vem o pitoresco nome popular do arvoredo, né? 

Essa relação é uma entre tantas outras que demonstra que tudo está interligado na Natureza e que devemos tomar medidas conservacionistas para que o impacto de nossas ações não causem ainda mais danos.

Esse que vos fala, Bruno, Bianca, Maurício e Bruno Dinucci sob o inhanduvai
Foto: Equipe P. E. do Espinilho


E foi assim, sob um inhanduvai, que fizemos a foto do grupo e nos despedimos da equipe mais top do Brasil. 

Nesse momento, já antecipando as saudades, me veio uma analogia da relação da ema com o inhanduvai, e de nós, observadores, com o Parque. 

Observadores/fotógrafos de todo país ajudam a disseminar a grande riqueza dessa unidade de conservação, auxiliando à sua perpetuação, na forma de divulgação e fomento ao turismo sustentável que mais cresce no Brasil.


Então, às aves!


domingo, 4 de setembro de 2022

O ninho

 Ave amigos!

Foi um momento tão especial que resolvi deixar aqui, registrado e compartilhado, principalmente para aqueles que comungam da mesma admiração, um pouco do que vi em Macaé/RJ, no primeiro dia desse mês.



Creio que mesmo sem ser um birder, ninguém passaria incólume diante de uma visão dessas


Foi com essa chegada triunfal do macho subadulto que fomos recebidos depois de uma viagem de quase 3 horas.

Um monstro alado voando com pesadas batidas de asas. Sabe aqueles filmes de dragões e seres mitológicos? Era o que mais se aproximava daquela cena.

A fêmea chegou com um galho com folhas


Aos fatos.

Um casal da nossa mais ameaçada águia (lembrando que há 9 águias no Brasil), a segunda maior do país (chega a 3,5 kg de peso, 1,90 m de envergadura e 85 cm de comprimento), resolveu fazer o primeiro ninho conhecido no país sobre uma construção humana. 
Só se tem notícia de mais um ninho nessas condições, na Argentina (Sarasola 2018). 
A diferença é que o ninho da Argentina estava a 10 metros do solo, enquanto o nosso está praticamente no topo de uma daquelas torres de transmissão de energia, a cerca de 40 metros do chão da floresta. E como se não fosse pouco, a enorme torre estava no alto de um morro cuja única visão era da estrada, no fundo do vale (o que é ótimo porque há casos de ninhos abandonados devido à presença humana).
Outro dado interessante que tivemos notícia no local é que se tem conhecimento desse ninho há 3 anos.

A pergunta que fica: com tantas árvores na região (o ninho se encontra dentro de uma unidade de conservação) porque esse casal escolheu fazer o ninho numa torre? 

Se algum dos nossos leitores trabalhar em empresa de energia seria interessante tentar fazer um levantamento de mais ninhos como esse.

Uma das visões do ninho


Quando chegamos o casal de águias-cinzentas (Urubitinga coronata) estava em plena atividade, levando material para o ninho, com pausa no trabalho para reforçar os laços (lembrando que, como outras espécies de águias, elas são monogâmicas):







Na última cena com essa fantástica águia, o macho nos sobrevoou, pegou uma térmica e sumiu atrás do morro. 









Despedimo-nos desejando sucesso ao casal na sagrada tarefa de perpetuação da espécie e agradecimentos aos amigos Serpa e Claudio pela ótima companhia, e ao Bruno Dinucci por ter me alertado sobre esse ninho incrível.

 





terça-feira, 5 de julho de 2022

Trilha dos Tucanos, o "point" quente do inverno (Parte final)

Ave!
A Trilha dos Tucanos é super bem frequentada, e não me refiro somente às aves. 
Quem é do ramo conhece muito bem o trabalho do professor e grande fotógrafo de aves Sérgio Gregório (quem ainda não conhece, não perca mais tempo: https://www.instagram.com/sergiogregoriophoto/). 
Tenho uma edição da revista Atualidades Ornitológicas, de 2013, que o apresenta, já naquela época, como um dos maiores fotógrafos do ramo do Brasil. Conhecendo-o pessoalmente pude perceber de onde vem tanta perfeição, sua dedicação e boa vontade são admiráveis. 
Ele estava trabalhando numa apresentação da técnica de multiflashes para um grupo gringo e com incrível gentileza não só me apresentou à tal técnica, como me proporcionou condições para fazer algumas fotos que curti demais (e que já foram publicadas nas primeiras partes desse relato). 
De minha parte só tenho a lhe agradecer por tudo e dizer que a minha admiração pelas fotos agora se estende à pessoa.
Fiquem agora com o resultado da mencionada técnica que, além de tudo, dá um super barato de usar.

Rabo-branco-de-garganta-rajada (Phaetornis eurynome)











Beija-flor-cinza (Aphantochroa cirrochloris















segunda-feira, 4 de julho de 2022

Trilha dos Tucanos, o "point" quente do inverno (Parte II)

 Ave amigos!

Agora vamos falar um pouco dos bichos que estão pintando nos comedouros da TT e, na sequência, uma técnica sensacional que aprendi com o Professor Sérgio Gregório. 

Pessoal, é incrível a quantidade de aves e de espécies que vão e vem, o dia inteiro, atraídas pelo banquete constantemente ofertado pelos anfitriões Marcão, Patrícia, Bia e Gabriel. O tratamento na TT é especial, não só pras aves, claro. Aproveito o ensejo para agradecê-los por toda a atenção dispensada a minha família, vocês mandaram muito bem pessoal!

Já falamos dos ramphastídeos e vocês já conheceram o simpático e confiante caxinguelê. Agora vou deixar as imagens falarem por mim. 

Fiquem com uma pequena amostra do desfile que cotidianamente podemos desfrutar no "paraíso das aves":

Benedito-de-testa-amarela (Melanerpes flavifrons) macho

"Benedita"

Pica-pau-de-cabeça-amarela (Celeus flavescens

As fantásticas tietingas (Cissopis leverianus) chegam sempre em bando




A TT é um dos melhores lugares para fotografar o belíssimo e esquivo tiê-de-bando (Habia rubica)


Periquito-rico (Brotogeris tirica), a espécie mais comum e que faz a festa da criançada


Tiriba-de-testa-vermelha (Pyrrhura frontalis)



Juriti-de-testa-branca (Leptotila rufaxilla), columbídeo dos mais ariscos



Bico-de-pimenta (Saltator fuliginosus)


Sabiá-coleira (Turdus albicollis), na minha opinião um dos mais belos 

Flagrei esse tiê-de-topete (Trichothraupis melanops) eriçado


Catirumbava (Orthogonys chloricterus) e saíra-sete-cores (Tangara seledon) estão entre as espécies mais presentes nos comedouros

Guaxe (Cacicus haemorrhous), mais conhecido pelo seu famoso ninho

Sanhaço-de-encontro-azul (Thraupis cyanoptera)




O gaturamo (Euphonia violacea), comum em comedouros, é raro nos da TT

Tiê-preto (Tachyphonus coronatus), apesar de comum, não é uma presença constante nos comedouros



Em 2020, o lendário macuco apareceu bem cedo ou bem tarde, quando a luz já estava muito ruim, e não consegui fazer boas fotos. Mas desta vez o grande tinamídeo já estava bem mais a vontade. Apareceu várias vezes ao longo dos dias e, com cautela, permitia uma ótima aproximação.

Já estava felizaço de conseguir fotos boas desse fantasma de nossas florestas, quando mais uma vez a Natureza me surpreende! 


Tinamus solitarius


Não conhecia esse display do macuco! Sensacional!!!

Na intimidade do paraíso temos mais chances de fazer um flagra desses

Bicho de mata bruta, foi extinto em vários locais de sua ocorrência original, como na minha terra


E para finalizar os "fantasmas" que pintam por lá, um uru exibindo seu estiloso penacho. 
Mas antes curtam essa escalada do bando para chegar ao comedouro das aparições (muito interessante como eles preferiram escalar, mesmo com alguma dificuldade, a simplesmente voar):

Acredito que esse seja o mesmo bando que registrei na trilha da Trilha



Uru (Odontophorus capoeira)

Ainda temos os beija-flores que frequentam os bebedouros, com destaque para a fêmea do topetinho-verde.

Lophornis chalybeus

E o beija-flor-cinza (Aphantochroa cirrochloris) que domina a área

Outro beija-flor que pinta bastante é o rabo-branco-de-garganta-rajada. Mas as fotos dele feitas com a técnica compartilhada pelo Professor Sérgio Gregório ficaram imbatíveis, vocês vão ver.😉